Hoje se destaca o centro espírita como escola de Espiritismo quando o futuro acena para que ele se promova à condição de Escola do Espírito. Como escola de Espiritismo os conteúdos doutrinários são mais valorizados que o homem, enquanto o foco na escola do Espírito converge às finalidades da agremiação para o “ser”, ou seja, sobre a complexidade existencial da criatura, suas necessidades, seus valores, suas habilidades. Precisamos promover a casa espírita de mera escola de estudos sistematizados e planejados para um centro de convivência e treinamento para desenvolvimento dos traços morais da regeneração.
É necessário humanizar a seara espírita, isto é, contextualizá-la, que é oferecer aos profitentes espíritas os instrumentos para que possam fazer dessa informação espírita a sua transformação espiritual. Contextualizar é humanizar a seara. Contextualizar é descobrir horizontes, respostas, caminhos. É construir o saber espírita através do autoconhecimento. O centro espírita, assim entendido, precisa ensinar o amor, educar o afeto. Eis o grande desafio no capítulo da transformação interior do ser. Nesta nova realidade proposta, a casa espírita apresenta-se como escola social das relações sinceras e duradouras, verdadeiro núcleo de treinamento da convivência regenerativa.
Para criação de relações afetivas sinceras impõe-se acabar com o artificialismo. Vejamos algumas características de ambientes espíritas artificiais: (1) maior possibilidade de criação e manutenção das máscaras emocionais que escondem uma pseudoharmonia; (2) campo para condutas estereotipadas provenientes de interpretações destituídas de bom senso; (3) ausência de ambiente para o debate crítico e avaliação sincera; (4) ambiente favorável para a hipocrisia e o puritanismo; (5) adubo para melindres; (6) ensejo para a adoção de “gurus” nos dois planos da vida gerando a idolatria; (7) larga porta para a desmotivação com o trabalho em razão de uma convivência desgastante e sem o enriquecimento de trocas; (8) desvalorização das habilidades cooperativas; (9) ambiente psiquicamente desagradável devido às opressões guardadas em silêncio; (10) ausência do diálogo como instrumento condutor de amizade sólida e (11) clima de desconfiança.
O fortalecimento de laços de afeto na seara espírita propiciará a confiança, a simpatia, a amizade, a alegria que geram o bem-estar para a convivência e terá como reflexo também a carinhosa indulgência com os limites e imperfeições no conjunto; melhores chances de converter os conflitos em lições; a valorização e compartilhamento das ideias e movimentações no bem uns pelos outros, sobretudo baseado em valores.
Não se poderá, porém, promover a afetividade sem que se exercite a alteridade. Alteridade é o estabelecimento de uma relação de paz com os diferentes, a capacidade de conviver bem com a diferença do qual o “outro” é portador. A ética da alteridade consiste basicamente em saber lidar com o outro, o diferente, o oposto, o distinto, o incomum ao mundo dos nossos sentidos pessoais, o desigual, que na sua realidade deve ser respeitado como é e como está, sem indiferença ou descaso, repulsa ou exclusão, em razão de suas particularidades. Conviver com os contrários e aprender a amá-los na sua diversidade constitui desafio ético aos grupamentos espiritistas no campo da alteridade. O Amor é sempre rico de alteridade e não existe sem ela.
A construção de laços de afeto no centro espírita deve começar por uma recepção fraterna aquele que chega em nossas searas, continuando com um atendimento fraterno e uma integração fraterna nas atividades.
Outro desafio a ser superado no centro e no movimento espírita de maneira geral é o teste dos cargos. Os cargos em si mesmos não são o problema. Eles são necessários para a disciplina, a ordem e o progresso das instituições. A relação de apego travada com os cargos é que podem constituir graves problemas para nossas sociedades. O teste dos cargos é uma aferição de desprendimento e humildade. Assumir responsabilidade junto a rótulos de poder significa teste de competência e abnegação. O dirigente é o principal responsável pela promoção afetiva na sua casa espírita e o construtor de iguais relações no movimento espírita.
Transformar o centro espírita em educandários do amor esta a meta a ser perseguida, cujo objetivo precípuo seja a formação do homem de bem. Primeiramente deve começar pelo autoamor, eliminando com a “cultura do sofrimento”. Esse autodesamor é subproduto do atávico religiosismo que edificamos no psiquismo, em séculos de superficialidade moral. Exercitar o amor em todos os ambientes afinal, como bem lembrou o Mestre do Amor: “Meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem”.
Carlos Pereira
Texto inspirado do livro "Laços de Afeto, Caminhos do Amor na Convivência", de Ermance Dufaux, pela psicografia de Wanderley de Oliveira.
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